As exportações da indústria agroalimentar nacional voltaram a bater recordes em 2024, ultrapassando os oito mil milhões de euros e cumprindo assim o objetivo fixado para o ano.
É um sinal do potencial exportador neste segmento e mais um passo no caminho até aos 10 mil milhões de vendas ao exterior até ao final da década, um marco que se tornará mais alcançável com a prioridade dada nas instituições europeias à recuperação da competitividade.
Um crescimento de 8,7% em 2024 colocou as vendas do setor agroalimentar ao exterior em 8.190 milhões de euros, ultrapassando assim a barreira dos 8 mil milhões, o objetivo desenhado pela Federação das Indústrias Portuguesas Agroalimentares (FIPA) para o ano que fechou. Este salto foi conseguido sobretudo pelo mercado europeu, que cresceu 12,6%, bastante acima da subida de 1,2% para os países extra-UE.
"Estamos praticamente, numa década, a duplicar as exportações da indústria em valor", começa por referir ao JE o presidente da FIPA, Jorge Henriques, embora já com a mira apontada ao próximo objetivo. "Isto impõe-nos um grande desafio: temos definido há alguns anos que nesta década temos de ultrapassar os 10 mil milhões, mesmo com as contingências que o mundo atravessa".
Espanha continua a ser o mercado mais relevante para a indústria nacional, pesando 38,6% do total exportado - uma evolução ainda mais assinalável se tivermos em conta que há quatro anos pesava 29% -, mas nem por isso deixou de crescer acima de 10%, com um salto de 13,2% em relação a 2023 até aos 3.159 milhões de euros. Na mesma linha, o Brasil cresceu 13,9%, chegando a 644 milhões exportados e mantendo o terceiro lugar como destino mais relevante da produção portuguesa.
Olhando especificamente para o mercado brasileiro, o acordo comercial com o Mercosul abrirá "novas portas e novos horizontes" para os produtos nacionais, que vinham enfrentando "muitas restrições" à entrada. E não falamos unicamente dos "produtos tradicionais, como o vinho e o azeite, mas também de, por exemplo, conservas de peixe e tomate", dois tipos de bens que têm vindo a ganhar importância e renome internacional.
Além do crescimento em relação ao ano anterior, o peso do Brasil no total exportado também subiu de 7,5% para 7,9%. De destacar ainda a evolução do mercado italiano, que cresceu 43,2%, com 484,5 milhões de euros.
Em sentido inverso, dos 12 destinos mais comuns para as exportações agroalimentares portuguesas, Alemanha, Angola e Suíça registaram decréscimos em relação ao ano anterior. A economia germânica, mergulhada numa recessão e numa crise estrutural, comprou menos 0,2% a Portugal, mas conseguiu ultrapassar Angola como o oitavo destino nacional, dada a perda de 8,6% nas vendas para o mercado angolano. A Suíça, último país do top-12, registou menos 0,7% de importações a Portugal.
Tarifas não assustam
A relação comercial com os EUA tem estado em foco nos últimos tempos, dada a ameaça de tarifas vindas de Washington, mas Jorge Henriques não se mostra demasiado preocupado com esta eventualidade. O mercado cresceu 4,2% em 2024, mas foi ultrapassado pelos Países Baixos como sexto destino dos bens agroalimentares portugueses, que subiu 11,9%.
Quanto à possibilidade de políticas protecionistas norte-americanas, o presidente da FIPA lembra que "ainda não há qualquer definição de nenhuma taxa" sobre o setor nacional, sendo que a indústria europeia tem "de olhar para os erros que cometeu e não se escudar" nestas medidas.
Falando num mercado "competitivo, caro para entrar", mas "com grande potencial", o representante do setor defende que "a Europa deve estar concentrada" e preparar-se para "criar alternativas" caso os EUA avancem com uma postura mais agressiva - e um dos países vizinhos pode assumir uma importância acrescida.
"Ao lado temos o México, que é outro dos mercados extremamente importantes para muitos dos players portugueses neste setor e outros", refere, sendo que as empresas olham cada vez mais para a "colocação de ativos estratégicos" naquelas geografias.
Azeite e vinho são quase um terço do total
Dois dos produtos emblemáticos da produção nacional representam quase um terço das exportações agroalimentares em 2024, o azeite e o vinho, sendo que, no primeiro caso, o crescimento é de mais de 45%. As exportações de azeite chegaram a 1.592 milhões de euros, uma subida de 46,5% em relação a 2023, uma evolução com forte influência da inflação registada neste bem - embora a subida em volume seja superior a 27%. Já o vinho subiu 4,5% até 965 milhões de euros exportados, sendo que, em conjunto, ambos os bens representam 31,2% do total exportado pelo setor. As conservas de tomate, laticínios e produtos de padaria e pastelaria fecham o top-5, tendo crescido, respetivamente, 1,4%, 3,3% e 6,7%. Entre os dez bens mais exportados, destaque para as conservas de peixe, a rubrica que mais cresceu a seguir ao azeite (13,3%) e para os açúcares e produtos de confeitaria, a única que recuou (6%). Este top-10 representa 58% do total de exportações agroalimentares em 2024, sendo composto, além dos produtos já mencionados, por cervejas de malte, produtos hortícolas preparados ou conservados e café, tudo categorias de bens a crescerem acima de 6%.
Rumo aos 10 mil milhões de vendas ao exterior até ao final da década
Exportações O próximo objetivo já está definido e o setor conta, para lá chegar, com uma diplomacia económica favorável e menos regulamentação de Bruxelas.
O rumo para a próxima década está bem definido: ultrapassar os 10 mil milhões de euros de exportações até ao final da década. Para isso, o setor quer um alinhamento da política económica com as necessidades dos empresários e uma UE menos restritiva, mas enaltece a relação positiva com o Governo até agora.
A conjuntura não é fácil, mas a evolução recente do ramo agroalimentar permite ter perspeti- vas positivas para os próximos anos, colocando a fasquia num nível ambicioso. A ajudar a este objetivo, o produto nacional é cada vez mais "reconhecido e apetecido em todas as geografias para onde exportamos", tanto pela sua qualidade, como pelo packaging e inovação, defende Jorge Henriques, presidente da FIPA.
Ainda assim, "é preciso uma consolidação dos instrumentos" ao dispor dos empresários para continuarem a sua afirmação internacional, uma política que vai para lá do apoio financeiro.
"Não me reporto apenas a envelopes financeiros, mas sim ao apoio dos diferentes escritórios: quer das organizações que são instrumentos para exportação, quer das embaixadas - da diplomacia económica", explica, sobretudo dado que "o desafio é crescer fora da UE".
Em concreto, o Ministério da Economia e a AICEP "poderão ter um papel extremamente importante a nível da promoção externa dos produtos nacionais", sendo que a FIPA classifica como "positivo" o relacionamento neste primeiro ano de Governo. "À frente dos dois ministérios com quem mais trabalhamos direta- mente, a Economia e a Agricultura, estão duas pessoas que conhecem bem o terreno, o setor e já deram mostras de um olhar criterioso" para o ramo, elogia Jorge Henriques.
Nesta linha, e além das vendas ao exterior, a internacionalização terá um papel preponderante. Urge criar marcas e "fortalecer" as já existentes, de forma a ganhar mais resistência a choques negativos - e têm sido vários nos últimos anos - e subir na cadeia de valor. As marcas nacionais dificilmente conseguirão competir "em pé de igualdade, porque a nossa dimensão é completamente diferente da dimensão de outras marcas a nível internacional", mas "Portugal já perdeu demasiado tempo".
Na dimensão europeia, a prioridade terá de ser o reforço da competitividade, agenda que a FIPA apoia. No detalhe, a necessidade de desregulamentação terá um impacto importante no setor, e, com Bruxelas a colocar a segurança económica a par da competitividade no topo das prioridades, as instituições europeias devem olhar para o ramo como "um eixo fundamental e estratégico".
"Não falo de um retrocesso, mas tem de se olhar para dentro e ver se tudo aquilo que fizemos não foi demasiado ambicioso relativamente àquilo que são as necessidades da economia europeia", continua, reiterando que tal "não pode comprometer nem a saúde dos consumidores, nem questões ambientais".
"A Europa não pode viver sem indústria, nem sem indústria alimentar. [...] Retomar o processo de industrialização é fundamental e, para isso, é preciso serem criadas as condições, como rever muita da legislação que tem levado a que as indústrias saiam da Europa", reforça.

Voltar
Comércio
Exportações nacionais batem recorde em 2024
As exportações da indústria agroalimentar nacional voltaram a bater recordes em 2024.
João Barros, Jornal Económico
14 fev. 2025
Imprensa Nacional