A transição de Macau para a soberania chinesa foi um sucesso porque ambas as partes se empenharam muito nisso.
A elite do Estado-Partido na China pretendia uma “transição serena e sem sobressaltos”, instrumental para convencer Taiwan a abrir negociações para a reunificação nacional sob o princípio “um país, dois sistemas”. As elites políticas de Portugal também pretendiam uma transição sem problemas, que pudesse funcionar como [sua] redenção relativamente aos processos de descolonização nas ex-colónias portuguesas em África e em Timor-Leste.
Preenchida a função redentora da sua transição, Macau desapareceu dos média lusos e das preocupações dos políticos portugueses. É duvidoso que Macau seja hoje percebido pelas empresas portuguesas como porta para a China.
Após a transição, a China criou um Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum Macau), cujo Secretariado Permanente está baseado em Macau. O potencial deste Fórum é enorme. Em relação a Portugal os resultados têm sido parcos. Os responsáveis do MOFCOM chinês que têm dirigido o Fórum movem-se bem no plano institucional, mas não no empresarial; a classe política portuguesa não percebe o potencial do Fórum; as associações empresariais lusas não sabem como aproveitar a lógica do Fórum para penetrar no mercado chinês, começando pela “Grande Baía”.
Apesar de a ascensão da China a superpotência económica e comercial ter conduzido as empresas chinesas a procurar os mercados maiores e com maiores rendimentos per capita, a China sempre quis aprofundar as relações com Portugal, construindo em cima da relação histórica centrada em Macau. As estatísticas mostram Portugal como destino relevante de investimento chinês devido à compra de participações sociais relevantes em algumas grandes empresas portuguesas há uma década atrás. Se excluirmos esses investimentos casuísticos, a presença de empresas chinesas em Portugal (e o IDE chinês em Portugal) é diminuta.
Apesar da louvável persistência da AICEP na China, dificilmente conseguiremos exportar mais bens ou serviços para a China. É possível promover mais parcerias entre empresas portuguesas e chinesas, sobretudo em terceiras geografias. E, sobretudo, podemos captar mais investimento chinês para Portugal. Num contexto em que o decoupling [americano] e o de-risking [europeu] vêm crescendo, as empresas chinesas e os seus financiadores dão preferência a mercados [de países] amigos para o investimento chinês. Nos 25 anos da transição de Macau, decisões recentes de governos portugueses (exclusão maximalista da Huawei no 5G e critérios não-técnicos restringindo fornecedores tecnológicos com base no país de origem, na proposta de Regime Jurídico da Cibersegurança) estão prestes a colocar Portugal fora desse universo.

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Comércio
Relações Portugal-China nos 25 anos da transição de Macau
É possível promover mais parcerias entre empresas portuguesas e chinesas.
Diário de Notícias
17 dez. 2024
Imprensa Nacional