Crise europeia As duas maiores economias da União Europeia estão em regime de sobrevivência a todo o custo. François Bayrou foi buscar, para espanto de muitos, as 'velhas guardas'. Olaf Scholz tenta sobreviver a mais um atentado.
É a tempestade política perfeita: as duas maiores economias da União Europeia, França e Alemanha, estão ao mesmo tempo - o que talvez não seja inédito, mas é muito raro - sob uma profunda crise política, a que a vertente económica serve de causa ou de consequência, conforme as opiniões. Os restantes 25 membros do bloco, enquanto tratam com algum desespero de escapar à importação das metástases das duas crises paralelas, pouco mais podem fazer que esperar que o pior passe o mais depressa possível. Em França e na Alemanha há muitos críticos que duvidam da eficácia dos decisores para ultrapassarem o mau momento.
Entre os gauleses
Em França, depois de mais umas semanas de comédia burlesca (palavras do "Le Monde"), o novo pri- meiro-ministro, François Bayrou surpreendeu toda a gente apresentando um governo que prima pela ausência de novidades. Pior que isso, prima pela presença de políticos que anteriormente falharam. Elisabeth Borne, Manuel Valls, Gérald Darmanin e vários outros antigos membros de governos próximos do presidente Emmanuel Macron tomam lugar para voltar a funções, para espanto de muitos comentadores. Os dois primeiros nomes são aqueles que levantam maiores dúvidas. Elisabeth Borne, antiga primeira-ministra (entre maio de 2022 e janeiro de 2024), acabou por ter de ser substituída depois de não conseguir ultrapassar dois problemas que são há décadas a razão do 'despiste' de qualquer pri- meiro-ministro: o sistema de pensões e as leis da imigração.
Manuel Valls é ainda mais surpreendente. Também antigo pri- meiro-ministro (entre abril de 2014 e dezembro de 2016), antigo mem
bro do Partido Socialista francês, não resistiu ao chamamento lançado por Macron sobre os membros do partido e foi atrás do homem que viria a ser presidente. Desiludiu-se algures a meio desse percurso, o que o levou a regressar à sua Catalunha natal - na tentativa de encontrar aí um qualquer processo de relançamento da sua vida política. O país seria diferente, mas o insucesso não: fracassou na candidatura à câmara de Barcelona (com o apoio do Cuidadanos) - e de então para cá esteve mais ou menos 'desaparecido em combate'.
Após dez dias de negociações por vezes públicas outras vezes secretas, o primeiro-ministro conseguiu uma coisa: cumprir o prazo que a si próprio impôs para apresentar o elenco do seu gabinete. Mas não conseguiu, segundo os críticos, o mais importante: formar uma equipa que à partida pudesse contar com o 'cheque em
branco' das oposições. Dito de outra forma: François Bayrou tem pela frente o espectro da moção de censura.
Entre os germanos
Quanto a Olaf Scholz, e como escrevia um comentador do "Der Spie- gel", já ninguém arrisca o que mais lhe poderá suceder. Depois de semanas consecutivas de problemas políticos dos mais diversos níveis, tudo culminou na noite da passada sexta-feira com um atentado num muito movimentado mercado de Natal em Magde- burgo. O presumível culpado - em prisão preventiva - é um assinalado membro da extrema-direita, mas é também um imigrante muçulmano e foi isso que se impôs como narrativa para o que aconteceu. Ou seja, Scholz sofreu mais um revés numa das áreas políticas em que sempre se mostrou mais sensível e mais exposto às críticas: a imigração.
Era claro para todos que a possibilidade de Olaf Scholz ser reeleito chanceler nas eleições antecipadas de 23 de fevereiro do próximo ano são mais que remotas, mas depois da noite de 20 de dezembro seguramente que nem o próprio acalenta qualquer esperança. O problema é que os social-demo- cratas estão reféns das suas próprias decisões: ao escolher o chanceler para concorrer a chanceler, o SPD impediu-se a si próprio de encontrar uma alternativa que pudesse emprestar ao partido motivos para antecipar um resultado um pouco acima de péssimo. A alternativa, como referem os jornais alemães, é que Scholz apareça o menos possível em campanha eleitoral. Mas com certeza que isso não enganará nenhum dos eleitores.
Em resumo: França e Alemanha passaram o Natal e seguramente passarão o fim de ano afundados numa severa crise política - que a crise económica só acentua - de que dificilmente se livrarão nos próximos meses.
Serviços de segurança sauditas alertaram sobre autor do atentado
Os serviços de segurança da Arábia Saudita alertaram pelo menos por três vezes os seus homólogos alemães sobre o suspeito do atentado em Magdeburgo, o saudita Taleb Abdulmohsen. Segundo os jornais alemães, o médico psiquiatra de 50 anos, a viver há 20 na Alemanha, tinha renegado a religião muçulmana e aderido à extrema-direita. Nesse quadro, as motivações para o que fez - de que resultou a morte de pelo menos quatro pessoas e ferimentos em cerca de duas centenas - são pouco claras. Aparentemente, a tese do radicalismo islamita perde força, mas, por outro lado, o histórico de atentados desta natureza perpetrados pelos extremistas de direita também não é costumeiro.
Segundo as mesmas fontes, há, portanto, uma segunda tese em análise: o desregramento psicológico. Para todos os efeitos, em termos políticos, a causa profunda do atentado acaba por não ser o mais importante: o que os alemães relevam - e os extremistas do AfD suportam - é que o autor do atentado é um imigrante muçulmano. E é com essa narrativa que o que sucedeu entra de rompante na pré-campanha eleitoral.
É a tempestade política perfeita: as duas maiores economias da União Europeia, França e Alemanha, estão ao mesmo tempo - o que talvez não seja inédito, mas é muito raro - sob uma profunda crise política, a que a vertente económica serve de causa ou de consequência, conforme as opiniões. Os restantes 25 membros do bloco, enquanto tratam com algum desespero de escapar à importação das metástases das duas crises paralelas, pouco mais podem fazer que esperar que o pior passe o mais depressa possível. Em França e na Alemanha há muitos críticos que duvidam da eficácia dos decisores para ultrapassarem o mau momento.
Entre os gauleses
Em França, depois de mais umas semanas de comédia burlesca (palavras do "Le Monde"), o novo pri- meiro-ministro, François Bayrou surpreendeu toda a gente apresentando um governo que prima pela ausência de novidades. Pior que isso, prima pela presença de políticos que anteriormente falharam. Elisabeth Borne, Manuel Valls, Gérald Darmanin e vários outros antigos membros de governos próximos do presidente Emmanuel Macron tomam lugar para voltar a funções, para espanto de muitos comentadores. Os dois primeiros nomes são aqueles que levantam maiores dúvidas. Elisabeth Borne, antiga primeira-ministra (entre maio de 2022 e janeiro de 2024), acabou por ter de ser substituída depois de não conseguir ultrapassar dois problemas que são há décadas a razão do 'despiste' de qualquer pri- meiro-ministro: o sistema de pensões e as leis da imigração.
Manuel Valls é ainda mais surpreendente. Também antigo pri- meiro-ministro (entre abril de 2014 e dezembro de 2016), antigo mem
bro do Partido Socialista francês, não resistiu ao chamamento lançado por Macron sobre os membros do partido e foi atrás do homem que viria a ser presidente. Desiludiu-se algures a meio desse percurso, o que o levou a regressar à sua Catalunha natal - na tentativa de encontrar aí um qualquer processo de relançamento da sua vida política. O país seria diferente, mas o insucesso não: fracassou na candidatura à câmara de Barcelona (com o apoio do Cuidadanos) - e de então para cá esteve mais ou menos 'desaparecido em combate'.
Após dez dias de negociações por vezes públicas outras vezes secretas, o primeiro-ministro conseguiu uma coisa: cumprir o prazo que a si próprio impôs para apresentar o elenco do seu gabinete. Mas não conseguiu, segundo os críticos, o mais importante: formar uma equipa que à partida pudesse contar com o 'cheque em
branco' das oposições. Dito de outra forma: François Bayrou tem pela frente o espectro da moção de censura.
Entre os germanos
Quanto a Olaf Scholz, e como escrevia um comentador do "Der Spie- gel", já ninguém arrisca o que mais lhe poderá suceder. Depois de semanas consecutivas de problemas políticos dos mais diversos níveis, tudo culminou na noite da passada sexta-feira com um atentado num muito movimentado mercado de Natal em Magde- burgo. O presumível culpado - em prisão preventiva - é um assinalado membro da extrema-direita, mas é também um imigrante muçulmano e foi isso que se impôs como narrativa para o que aconteceu. Ou seja, Scholz sofreu mais um revés numa das áreas políticas em que sempre se mostrou mais sensível e mais exposto às críticas: a imigração.
Era claro para todos que a possibilidade de Olaf Scholz ser reeleito chanceler nas eleições antecipadas de 23 de fevereiro do próximo ano são mais que remotas, mas depois da noite de 20 de dezembro seguramente que nem o próprio acalenta qualquer esperança. O problema é que os social-demo- cratas estão reféns das suas próprias decisões: ao escolher o chanceler para concorrer a chanceler, o SPD impediu-se a si próprio de encontrar uma alternativa que pudesse emprestar ao partido motivos para antecipar um resultado um pouco acima de péssimo. A alternativa, como referem os jornais alemães, é que Scholz apareça o menos possível em campanha eleitoral. Mas com certeza que isso não enganará nenhum dos eleitores.
Em resumo: França e Alemanha passaram o Natal e seguramente passarão o fim de ano afundados numa severa crise política - que a crise económica só acentua - de que dificilmente se livrarão nos próximos meses.
Serviços de segurança sauditas alertaram sobre autor do atentado
Os serviços de segurança da Arábia Saudita alertaram pelo menos por três vezes os seus homólogos alemães sobre o suspeito do atentado em Magdeburgo, o saudita Taleb Abdulmohsen. Segundo os jornais alemães, o médico psiquiatra de 50 anos, a viver há 20 na Alemanha, tinha renegado a religião muçulmana e aderido à extrema-direita. Nesse quadro, as motivações para o que fez - de que resultou a morte de pelo menos quatro pessoas e ferimentos em cerca de duas centenas - são pouco claras. Aparentemente, a tese do radicalismo islamita perde força, mas, por outro lado, o histórico de atentados desta natureza perpetrados pelos extremistas de direita também não é costumeiro.
Segundo as mesmas fontes, há, portanto, uma segunda tese em análise: o desregramento psicológico. Para todos os efeitos, em termos políticos, a causa profunda do atentado acaba por não ser o mais importante: o que os alemães relevam - e os extremistas do AfD suportam - é que o autor do atentado é um imigrante muçulmano. E é com essa narrativa que o que sucedeu entra de rompante na pré-campanha eleitoral.