De acordo com o Jornal Económico, o mercado da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID) representa mais de 500 mil milhões de dólares (cerca de 460 mil milhões de euros, ao câmbio atual) e Isidro Simões, partner da consultora Mundi Consulting, diz ao Jornal Económico (JE) que "existirão sempre mais recursos financeiros disponíveis para financiar projetos de desenvolvimento económico e social do que a capacidade de produzir projetos para usar esses recursos". Ou seja, existem oportunidades para explorar.
A Mundi Consulting surgiu em 1988, para ajudar as empresas no desenvolvimento de projetos aproveitando o primeiro quadro comunitário de apoio, mas evoluiu para apoiar projetos de internacionalização de empresas, suportados por financiamento de entidades internacionais.
"Tivemos de fazer uma opção estratégica que foi, face à relativa queda do mercado [português com o alargamento da União Europeia], começámos a olhar para onde havia dinheiro para apoiar as organizações nos seus projetos e começámos a entender o funcionamento do mercado CID, que é um mercado supranacional constituído por organizações supra- governamentais, em que os governos são os sócios dessas entidades internacionais e essas entidades internacionais colocam fundos em organizações para aplicar nos projetos de desenvolvimento económico e social dos países", explica Isidro Simões.
Apesar das oportunidades apresentadas pelo mercado CID, as empresas portuguesas ainda não olham para este segmento. 'Ainda há algum desconhecimento desta possibilidade", diz Simões. "Portugal é sócio dessas entidades internacionais, paga quota para fazer parte do Banco Mundial, do Banco Africano, das entidades internacionais que cooperam em temas multilaterais ou bilaterais", aponta, acrescentando eu "há uma discussão grande, por vezes, porque os contratos que as empresas ganham em relação ao dinheiro que o Governo de Portugal coloca nesse mercado ainda é reduzido".
"Ou seja, deveria haver mais empresas a participar neste mercado para se aumentar o retorno financeiro do investimento que Portugal faz a participar. E há espaço", sublinha, acrescentando que se trata de um mercado com um nível elevado de segurança, porque é garantido por entidades internacionais.
Potencial nos PALOP
A Mundi Consulting opera no mercado dos países de língua portuguesa, mas também está presente noutros, como na índia. Em África, onde a empresa tem maior atividade, Isidro Simões vê um grande potencial para desenvolvimento, que pode ser explorado. "São países que em que a base, nalguns casos, é baixa e, portanto, há um crescimento grande para acontecer. O nível de oportunidades existentes é grande e o
nível de robustez do mercado vai crescendo aos poucos", afirma.
Na análise que faz aos diferentes países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP) com que trabalha, diz que Angola "houve tempo em que tinha outro nível de recursos financeiros e não se dedicava a este mercado [CDI]", mas aponta que "agora, a situação está um pouco diferente e já vê aqui uma boa saída para a sua economia".
"Moçambique é o melhor parceiro deste mercado porque tem a capacidade de usar muitos destes recursos. Mais de metade do orçamento moçambicano é [composto] com fundos destas entidades internacionais, portanto é o [PALOP] que usa, de longe, mais recursos deste mercado internacional", explica.
"Cabo Verde é mais pequeno, mas é um país mais sofisticado e já é mais exigente no nível de projetos. São Tomé é pequeno em tudo, inclusive na dimensão dos próprios projetos", considera. Termina com a Guiné-Bissau, que "está sempre em alguma convulsão, o que faz com que os próprios projetos, às vezes, não tenham continuidade".
Os sectores preferenciais são os relacionados com o âmbito do desenvolvimento económico e social que norteia orienta o mercado CDI. "São projetos ao nível da governação, da educação, da saúde", explica Simões. "Depois é que pode evoluir um pouco mais para alguns sectores, como o turismo, desenvolvimento territorial, modelos de governação de municípios, infraestruturas, mas estamos a falar de segmentos de base necessários para o funcionamento de uma sociedade", acrescenta.
"Empresas que tenham atividade nestes sectores têm aqui muitas oportunidades", diz.
E garante que a língua portuguesa constitui uma mais-valia, mesmo se é obrigatório ter em conta as particularidades dos diversos mercados. "É uma vantagem", sublinha. "Há aqui uma grande vontade de autonomia, mas a língua é um ativo e uma mais-valia que nós temos e que nós, empresas portuguesas, devemos aproveitar", diz. "Ganhamos muitos projetos em consórcios internacionais, porque estamos no consórcio para falar português. E eles procuram-nos por isso, as grandes consultoras internacionais que também trabalham para esses mercados", exemplifica.
Quatro perguntas a...
Isidro Simões Planeamento como pedra basilar, escolher bem as lideranças, procurar ter relações locais e estruturar bem o projeto são passos essenciais para um processo de internacionalização. Depois, financiamento e uma preocupação constante com a inovação.
Procurar entrosar com parceiros locais é fundamental
O advisor Isidro Simões aponta o que a consultoria pode trazer às empresas e o que a sua experiência na internacionalização pode acrescentar ao negócio. Esta é uma parceria do Jornal Económico com a rede de advisors da Bridgewhat.
Que valor podem os 'advisors' trazer às empresas?
Os advisors, regra geral, caracteri- zam-se por possuir uma experiência acumulada por via de terem vivenciado muitas situações ao longo do seu percurso profissional, o que lhes permite ter uma perce- ção e visão sustentada sobre as situações que se deparam à vida das organizações no seu processo de crescimento, quer operacionais quer estratégicas. Existe, assim, todo um conhecimento que permite às empresas terem a oportunidade de "queimar etapas" e "ter ganhos", recorrendo a alguém que possa contribuir para o acelerar de tomada de decisões e de implementação de projetos e atividades que poderiam ter necessidade de mais tempo. Adicionalmente, o ter alguém "de fora", que não esteja totalmente "influenciado" com a realidade da organização, permitirá equacionar outros cenários e alternativas para o crescimento. O networking, o conhecimento dos mercados, o saber quem são os decision makers, entre outras, são tudo vantagens decorrentes de utilizar o conhecimento de um advisor, em alternativa a ter de investir em tempos e recursos na criação de conhecimento interno na organização.
O que destaca na sua experiência e conhecimento?
O meu percurso profissional na área da consultoria de gestão, incluindo ao nível dos mercados internacionais, confunde-se com o percurso da Mundi Consulting, pelo que destacaria duas vivências. Uma relacionada com a estruturação de processo de gestão, desenvolvido há mais 25 anos de transformar uma "ideia" num projeto, alinhado com a identificação das fontes de financiamento para a sua implementação, incluindo o acesso a fundos europeus e a fundos de instituições financeiras internacionais, no mercado CID - Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. Uma outra, relacionada com a procura de canais alternativos de implementação de projetos de internacionalização, que foi o grande shift conseguido com a Mundi Consulting, via procurement internacional no mercado CID. Ter participado no processo de internacionalização pela Mundi Consulting permitirá ajudar as empresas a criarem um canal de vendas para também fazerem negócios neste canal do procurement internacional dos concursos públicos internacionais, saltando muitas etapas de criação de sinergias internas para o fazerem.
Como vê o projeto da Bridgewhat?
Um projeto muito interessante, de procurar juntar necessidades de crescimento das empresas com conhecimentos de intervenção de pessoas que possuem uma vivência do mundo empresarial e do desenvolvimento de negócios. O sucesso do projeto BridgeWhat estará em conseguir-se, continuamente, fazer acontecer um match - na perspetiva de se cruzarem - entre os desafios das empresas e a disponibilização da ajuda pelos especialistas.
Que recomendações daria aos empresários e gestores portugueses?
Pensando numa lógica de gerir um projeto de internacionalização, deixaria várias sugestões, a começar pelo planeamento, que será a pedra basilar para qualquer projeto empresarial, mais importante se estivermos a falar de projetos de internacionalização que, regara geral, poderão levar três a cinco anos para se consolidarem. O planeamento serve para pensarmos, refle- tirmos, discutirmos, e, sobretudo, assumirmos a dimensão de risco até onde queremos ir. Depois, uma particular atenção em identificar ou escolher gestores com valências e competências que possam ser líderes autónomos do projeto. Procurar estabilizar, e sobretudo entrosar, com parceiros locais, é uma ação fundamental para querer "ser-se conhecido como uma empresa local", no mercado onde queremos estar. A cultura local, a obrigatoriedade de se "saber como estar e como ser" junto do mercado local, é uma condição transcendental para se fazer negócios. Ter o projeto bem estruturado, desde a ideia de negócio, até à sua implementação e operacio- nalização no dia-a-dia, é essencial para que o projeto global possa ser monitorizado e utilizado como verdadeiro instrumento de gestão. Adicionalmente, fazer uma boa "compra" de dinheiros para financiar o projeto. E por fim, deverá existir sempre a preocupação de inovar no negócio.
Existirão sempre mais recursos financeiros disponíveis para financiar projetos de desenvolvimento económico e social, do que a capacidade de 'produzir' projetos para usar esses recursos"
Perfil: especialista em desenvolvimento
Isidro Simões é membro do conselho de gestão e sócio da consultora Mundi Consulting e assessor na rede da Bridgewhat.
Economista, licenciado na Universidade Nova de Lisboa, tem uma experiência de 33 anos a coordenar e implementar projetos de consultoria, especialmente na área de desenvolvimento económico e social e na mobilização de financiamentos e apoios financeiros para projetos. É um conhecedor do mercado da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, especialista em procurement international de tenders (concursos) e grants (financiamentos), com trabalho feito nos mercados de língua portuguesa, particularmente em África.