Estudo do ISCTE para a ANI mapeia as áreas onde Portugal se distingue em termos técnicos, científicos e empresariais, e onde o Estado deve claramente apostar em termos de investigação, desenvolvimento e inovação. Norte e Centro do país destacam-se em áreas de especialização.
A economia portuguesa tem 18 áreas de especialização onde dá cartas, registando vantagens tecnológicas e de mercado acima de outros países. Na lista constam casos como as tecnologias de materiais na indústria têxtil, a química no agroalimentar ou a biotecnologia na saúde, que, segundo um estudo encomendado pela Agência Nacional de Inovação (ANI), devem ser prioritárias para a política de investigação, desenvolvimento e inovação (I&I). “Estas são áreas onde há claramente capacidades distintivas e promissoras”, diz ao Expresso o economista Ricardo Paes Mamede, coordenador do trabalho, que, contudo, ressalva que “não são necessariamente as únicas onde o Estado deve apostar”.
No estudo realizado pelo Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do ISCTE (IPPS-ISCTE) sobre “áreas prioritárias da Estratégia Nacional de Especialização Inteligente (ENEI 2030)”, os autores começam por identificar as capacidades de investigação, desenvolvimento e inovação (I&I) existentes no país. Ao todo, avaliaram 192 áreas potenciais de aplicação de tecnologias, mas, destas, só uma pequena parte sobressai com competências distintivas. Após cruzarem fatores como os níveis de intensidade tecnológica e inovação, o peso na economia nacional ou o dinamismo nos mercados internacionais, o estudo destaca “18 que têm um peso relevante na economia portuguesa e cujos produtos registaram no passado recente uma procura internacional acima da média, sugerindo a existência de oportunidades de mercado consideráveis”.
Agroalimentar, saúde, transporte e mobilidade, têxteis, vestuário e calçado, ferramentas, máquinas e equipamentos e serviços de tecnologias de informação e comunicação são sectores de atividade onde o país apresenta capacidades tecnológicas muito relevantes, em áreas específicas como a biotecnologia, a química, a eletrónica, a tecnologia dos materiais, as tecnologias digitais e as tecnologias de produção. Situadas sobretudo no norte e centro do país, é aqui que Portugal se destaca em termos científicos e empresariais ou tem algum grau de distinção relativamente a alguns países europeus.
“Estas são áreas às quais o Estado deve dar atenção à partida”, garantindo que têm condições para continuarem a desenvolver-se, diz ao Expresso Ricardo Paes Mamede, professor no ISCTE e coordenador do estudo da ANI. São áreas onde “já há capacidade instalada, empresas com massa crítica, já há dinâmica de mercado e, nalguns casos, há competências distintivas face a outros países”.
“No têxtil e vestuário Portugal tem uma vantagem claríssima na investigação e patenteamento de tecnologias dos materiais”, diz Paes Mamede. A “resistência de produtos têxteis ao frio, ao calor, à água, a possibilidade de incorporação de eletrónica nas fibras têxteis têm dimensões tecnológicas e científicas significativas, devido à capacidade do sistema cientifico falar com empresarial”, e Portugal destaca-se particularmente nestas dimensões, situa.
Aliás, “a química, a física, a engenharia dos materiais, na saúde, no agroalimentar, nos equipamentos de transporte, são áreas de notório sucesso na ligação entre universidades, centros tecnológicos e empresas”, diz Ricardo Paes Mamede.
HÁ APOIOS PÚBLICOS PARA LÁ DO DINHEIRO
O estudo diz que estes são subsectores onde o Estado deve, inequivocamente, centrar os apoios em I&I, como recomendam as regras europeias. Contudo, dizer que o Estado deve apostar nestas dimensões “não é o mesmo que dizer que o Estado português tem de colocar dinheiro nestas áreas”, sublinha Ricardo Paes Mamede. Até porque “a intervenção pública faz-se de diversas formas”, desde a formação profissional, a diplomacia económica e dinamização de uma rede alargada de atores, apoios à investigação, investimento em capacidade produtiva.
Também não significa que estas sejam as únicas apostas, ressalva o economista. O estudo debruça-se sobre as áreas onde já há capacidade instalada, mas os investigadores alertam para nichos em desenvolvimento que merecem uma atenção especial, como é o caso da biotecnologia aplicada à “pesca, aquacultura e produtos da pesca”. É uma área onde não há ainda uma estrutura produtiva sólida, mas que se destaca em “todos os indicadores que permitem comparações internacionais (projetos do Horizonte 2020, pedidos de patentes, artigos científicos e exportações), revelando a forte especialização tecnológica e científica de Portugal nesta área”, sublinha o relatório.
AUTONOMIA ESTRATÉGICA
A política industrial saltou nos últimos anos para o centro do debate económico europeu, com a Europa a caminhar para uma “autonomia estratégica aberta”, uma abordagem que é um meio caminho entre as perspetivas mais protecionistas e as mais liberais. Em Portugal, o debate oscila entre a necessidade de dirigir os dinheiros públicos para sectores específicos, em vez de os distribuir de forma transversal — uma das bandeiras de Pedro Nuno Santos — e a posição do Governo, que recusa qualquer forma de condicionamento.
Ricardo Paes Mamede, enquanto coordenador do trabalho, distancia-se do debate. “Os recursos públicos não devem ser distribuídos de forma indiscriminada, devendo o Estado definir áreas de aposta — não as empresas em que aposta, mas as áreas. Esse debate está fora do âmbito do estudo”, diz ao Expresso. Desde logo, porque “o que se apoia em concreto, e como se faz, exige que se vá aos detalhes”. Depois, porque “as boas práticas das políticas públicas exigem que se fale com as entidades competentes, com os atores relevantes. Que se ouçam empresas, associações empresariais, universidades, centros de investigação”. “O que posso dizer, como académico, é que gostaria que o estudo contribuísse para aprofundar a discussão pública sobre as áreas prioritárias das políticas públicas de I&D, de inovação, de modo a torná-las mais eficazes”, remata.
Para terem acesso a fundos nos domínios da investigação, desenvolvimento e inovação (I&I), os países estão obrigados a desenhar uma estratégia por cada quadro comunitário de apoio, definindo um conjunto limitado de prioridades de intervenção pública, mas Portugal destaca-se como tendo as “estratégias de especialização nacionais com um nível mais reduzido de seletividade”.
O estudo foi pedido pela Agência Nacional de Inovação (ANI) ao Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do ISCTE depois de a Comissão Europeia ter concluído que a Estratégia Nacional de Especialização Inteligente (ENEI 2030) portuguesa era demasiado abrangente.
FRASES
“A química, a física, a engenharia dos materiais, na saúde, no agroalimentar, nos equipamentos de transporte, são áreas de notório sucesso na ligação entre universidades, centros tecnológicos e empresas”
“Os recursos públicos não devem ser distribuídos de forma indiscriminada, devendo o Estado definir áreas de aposta, não as empresas em que aposta”
“Dizer que o Estado deve apostar nestas dimensões não é o mesmo que dizer que tem de colocar dinheiro nestas áreas. A intervenção pública faz-se de diversas formas”
Ricardo Paes Mamede, Professor no ISCTE, coordenador do estudo para a ANI
NORTE E CENTRO DESTACAM-SE
AGROALIMENTAR
Áreas de especialização: biotecnologia, química, tecnologias digitais
Regiões: norte, centro, Lisboa, Algarve, Alentejo
EQUIPAMENTO DE TRANSPORTE
Áreas de especialização: eletrónica, tecnologias de produção, tecnologias digitais, tecnologias dos materiais
Regiões: norte, centro
FERRAMENTAS, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS
Áreas de especialização: tecnologias de produção, tecnologias digitais, tecnologias dos materiais
Regiões: norte, centro
SAÚDE
Áreas de especialização: biotecnologia, eletrónica, tecnologias digitais, tecnologias dos materiais
Regiões: norte, centro, Lisboa, Alentejo, Algarve
SERVIÇOS DE TIC
Áreas de especialização: tecnologias digitais
Regiões: norte, centro, Lisboa, Algarve
SERVIÇOS DE TRANSPORTE E MOBILIDADE
Áreas de especialização: eletrónica, tecnologias digitais
Regiões: norte, centro, Lisboa
TÊXTEIS, VESTUÁRIO E CALÇADO
Áreas de especialização: tecnologias dos materiais
Regiões: norte
A economia portuguesa tem 18 áreas de especialização onde dá cartas, registando vantagens tecnológicas e de mercado acima de outros países. Na lista constam casos como as tecnologias de materiais na indústria têxtil, a química no agroalimentar ou a biotecnologia na saúde, que, segundo um estudo encomendado pela Agência Nacional de Inovação (ANI), devem ser prioritárias para a política de investigação, desenvolvimento e inovação (I&I). “Estas são áreas onde há claramente capacidades distintivas e promissoras”, diz ao Expresso o economista Ricardo Paes Mamede, coordenador do trabalho, que, contudo, ressalva que “não são necessariamente as únicas onde o Estado deve apostar”.
No estudo realizado pelo Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do ISCTE (IPPS-ISCTE) sobre “áreas prioritárias da Estratégia Nacional de Especialização Inteligente (ENEI 2030)”, os autores começam por identificar as capacidades de investigação, desenvolvimento e inovação (I&I) existentes no país. Ao todo, avaliaram 192 áreas potenciais de aplicação de tecnologias, mas, destas, só uma pequena parte sobressai com competências distintivas. Após cruzarem fatores como os níveis de intensidade tecnológica e inovação, o peso na economia nacional ou o dinamismo nos mercados internacionais, o estudo destaca “18 que têm um peso relevante na economia portuguesa e cujos produtos registaram no passado recente uma procura internacional acima da média, sugerindo a existência de oportunidades de mercado consideráveis”.
Agroalimentar, saúde, transporte e mobilidade, têxteis, vestuário e calçado, ferramentas, máquinas e equipamentos e serviços de tecnologias de informação e comunicação são sectores de atividade onde o país apresenta capacidades tecnológicas muito relevantes, em áreas específicas como a biotecnologia, a química, a eletrónica, a tecnologia dos materiais, as tecnologias digitais e as tecnologias de produção. Situadas sobretudo no norte e centro do país, é aqui que Portugal se destaca em termos científicos e empresariais ou tem algum grau de distinção relativamente a alguns países europeus.
“Estas são áreas às quais o Estado deve dar atenção à partida”, garantindo que têm condições para continuarem a desenvolver-se, diz ao Expresso Ricardo Paes Mamede, professor no ISCTE e coordenador do estudo da ANI. São áreas onde “já há capacidade instalada, empresas com massa crítica, já há dinâmica de mercado e, nalguns casos, há competências distintivas face a outros países”.
“No têxtil e vestuário Portugal tem uma vantagem claríssima na investigação e patenteamento de tecnologias dos materiais”, diz Paes Mamede. A “resistência de produtos têxteis ao frio, ao calor, à água, a possibilidade de incorporação de eletrónica nas fibras têxteis têm dimensões tecnológicas e científicas significativas, devido à capacidade do sistema cientifico falar com empresarial”, e Portugal destaca-se particularmente nestas dimensões, situa.
Aliás, “a química, a física, a engenharia dos materiais, na saúde, no agroalimentar, nos equipamentos de transporte, são áreas de notório sucesso na ligação entre universidades, centros tecnológicos e empresas”, diz Ricardo Paes Mamede.
HÁ APOIOS PÚBLICOS PARA LÁ DO DINHEIRO
O estudo diz que estes são subsectores onde o Estado deve, inequivocamente, centrar os apoios em I&I, como recomendam as regras europeias. Contudo, dizer que o Estado deve apostar nestas dimensões “não é o mesmo que dizer que o Estado português tem de colocar dinheiro nestas áreas”, sublinha Ricardo Paes Mamede. Até porque “a intervenção pública faz-se de diversas formas”, desde a formação profissional, a diplomacia económica e dinamização de uma rede alargada de atores, apoios à investigação, investimento em capacidade produtiva.
Também não significa que estas sejam as únicas apostas, ressalva o economista. O estudo debruça-se sobre as áreas onde já há capacidade instalada, mas os investigadores alertam para nichos em desenvolvimento que merecem uma atenção especial, como é o caso da biotecnologia aplicada à “pesca, aquacultura e produtos da pesca”. É uma área onde não há ainda uma estrutura produtiva sólida, mas que se destaca em “todos os indicadores que permitem comparações internacionais (projetos do Horizonte 2020, pedidos de patentes, artigos científicos e exportações), revelando a forte especialização tecnológica e científica de Portugal nesta área”, sublinha o relatório.
AUTONOMIA ESTRATÉGICA
A política industrial saltou nos últimos anos para o centro do debate económico europeu, com a Europa a caminhar para uma “autonomia estratégica aberta”, uma abordagem que é um meio caminho entre as perspetivas mais protecionistas e as mais liberais. Em Portugal, o debate oscila entre a necessidade de dirigir os dinheiros públicos para sectores específicos, em vez de os distribuir de forma transversal — uma das bandeiras de Pedro Nuno Santos — e a posição do Governo, que recusa qualquer forma de condicionamento.
Ricardo Paes Mamede, enquanto coordenador do trabalho, distancia-se do debate. “Os recursos públicos não devem ser distribuídos de forma indiscriminada, devendo o Estado definir áreas de aposta — não as empresas em que aposta, mas as áreas. Esse debate está fora do âmbito do estudo”, diz ao Expresso. Desde logo, porque “o que se apoia em concreto, e como se faz, exige que se vá aos detalhes”. Depois, porque “as boas práticas das políticas públicas exigem que se fale com as entidades competentes, com os atores relevantes. Que se ouçam empresas, associações empresariais, universidades, centros de investigação”. “O que posso dizer, como académico, é que gostaria que o estudo contribuísse para aprofundar a discussão pública sobre as áreas prioritárias das políticas públicas de I&D, de inovação, de modo a torná-las mais eficazes”, remata.
Para terem acesso a fundos nos domínios da investigação, desenvolvimento e inovação (I&I), os países estão obrigados a desenhar uma estratégia por cada quadro comunitário de apoio, definindo um conjunto limitado de prioridades de intervenção pública, mas Portugal destaca-se como tendo as “estratégias de especialização nacionais com um nível mais reduzido de seletividade”.
O estudo foi pedido pela Agência Nacional de Inovação (ANI) ao Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do ISCTE depois de a Comissão Europeia ter concluído que a Estratégia Nacional de Especialização Inteligente (ENEI 2030) portuguesa era demasiado abrangente.
FRASES
“A química, a física, a engenharia dos materiais, na saúde, no agroalimentar, nos equipamentos de transporte, são áreas de notório sucesso na ligação entre universidades, centros tecnológicos e empresas”
“Os recursos públicos não devem ser distribuídos de forma indiscriminada, devendo o Estado definir áreas de aposta, não as empresas em que aposta”
“Dizer que o Estado deve apostar nestas dimensões não é o mesmo que dizer que tem de colocar dinheiro nestas áreas. A intervenção pública faz-se de diversas formas”
Ricardo Paes Mamede, Professor no ISCTE, coordenador do estudo para a ANI
NORTE E CENTRO DESTACAM-SE
AGROALIMENTAR
Áreas de especialização: biotecnologia, química, tecnologias digitais
Regiões: norte, centro, Lisboa, Algarve, Alentejo
EQUIPAMENTO DE TRANSPORTE
Áreas de especialização: eletrónica, tecnologias de produção, tecnologias digitais, tecnologias dos materiais
Regiões: norte, centro
FERRAMENTAS, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS
Áreas de especialização: tecnologias de produção, tecnologias digitais, tecnologias dos materiais
Regiões: norte, centro
SAÚDE
Áreas de especialização: biotecnologia, eletrónica, tecnologias digitais, tecnologias dos materiais
Regiões: norte, centro, Lisboa, Alentejo, Algarve
SERVIÇOS DE TIC
Áreas de especialização: tecnologias digitais
Regiões: norte, centro, Lisboa, Algarve
SERVIÇOS DE TRANSPORTE E MOBILIDADE
Áreas de especialização: eletrónica, tecnologias digitais
Regiões: norte, centro, Lisboa
TÊXTEIS, VESTUÁRIO E CALÇADO
Áreas de especialização: tecnologias dos materiais
Regiões: norte