AICEP estima que, num cenário de estagnação económica, as exportações portuguesas tenham de crescer, pelo menos, 3,4% ao ano para equivalerem a 55% do PIB em 2029. Mas, se a economia crescer ao ritmo dos últimos cinco anos, vão ter de aumentar 7% ao ano, mais do que a média histórica.
Até ao final da década, o Governo quer ter as exportações a valerem o equivalente a 55% do produto interno bruto (PIB). Mas, para alcançar essa meta e admitindo que a economia não entra em contração, a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) estima que será necessário garantir que o montante total vendido por Portugal ao exterior, em bens e serviços, aumente mais de 3% ao ano.
A conclusão consta do estudo 'A Economia Portuguesa em Contexto de Incerteza Mundial: Análise das Dinâmicas Comerciais", divulgado pela AICEP nesta quinta-feira.
Tendo como referência aos dados de 2024 - em que, em termos nominais, o total das exportações foi de 133 mil milhões de euros e o PIB foi de 285 mil milhões -, a agência pública estima que "as exportações necessitarão de crescer aproximadamente 3,4% ao ano", em termos homólogos, para que a meta do Executivo de Luís Montenegro seja atingida
Esses 3,4% de crescimento homólogo representam, no entanto, o ritmo mínimo que as exportações terão de crescer ao ano, em termos nominais, já que o cálculo é feito para "um cenário de PIB constante", ou seja, em que o crescimento económico é nulo. Isso significa que, se a variação homóloga do PIB for superior a 0%, as exportações vão ter de crescer acima dos 3,4% estimados para atingirem um peso de 55% do PIB em 2029.
Num cenário mais realista - tendo em conta que nenhuma das entidades que acompanham a evolução da economia portuguesa aponta para uma estagnação do PIB até ao final da década -, a AICEP dá conta de que, por exemplo, se o crescimento do PIB nominal médio anual for de 5% até 2029 - mais ou menos em linha com o que se verificou nos últimos cinco anos -, "o crescimento das exportações deverá situar-se em 8,6%".
Com a incerteza provocada pelas tarifas e as tensões geopolíticas na Ucrânia e no Médio Oriente, espera-se que o PIB nominal cresça em torno dos 4%, segundo as projeções económicas do Conselho das Finanças Públicas (CFP) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) - os únicos que têm previsões até 2029. Ora, usando a mesma fórmula da AICEP, a subida homóloga das exportações terá, por isso, de ser de 7,6% para atingir a meta do Governo.
O valor fica acima do que tem sido a média de crescimento nominal das exportações das últimas três décadas (6,5%), o que significa que as exportações vão ter de crescer a um ritmo mais rápido do que o observado até aqui.
Crescer acima da média vai ser, porém, um desafio. Embora as exportações tenham crescido no primeiro semestre - devido, sobretudo, à antecipação das tarifas de Donald Trump -, as projeções económicas apontam para uma desaceleração das vendas de bens e serviços ao exterior nos próximos meses. Além do impacto das tarifas, espera-se que o fraco crescimento da economia europeia e a normalização dos padrões de consumo, incluindo de turismo, após o período pós-pandemia possam penalizar as exportações nacionais.
A entidade liderada por Madalena Oliveira e Silva reconhece que é difícil aferir qual será o comportamento das exportações nacionais, já que as tarifas afetam diretamente os países visados e outros países "integrados nas mesmas cadeias de valor globais". "Consequentemente, as empresas portuguesas podem ser adversamente afetadas por incrementos nos custos dos inputs, desvios nos fluxos comerciais ou perda de competitividade, sem que tais impactos sejam imediatamente percetíveis nas estatísticas oficiais", indica.
Exportações perdem peso desde 2023
As exportações portuguesas atingiram o maior peso face ao PIB em 2022, tendo tocado na altura os 50%. Na altura, esse resultado histórico foi atribuído a ganhos de quota de mercado, mas a inflação deu um forte contributo, já a subida dos preços das mercadorias aumentaram de forma "artificial" o total vendido ao exterior, em termos nominais (que não excluem os efeitos da inflação). Desde então, as vendas de Portugal ao exterior tem perdido todos os anos força em relação à riqueza produzida.
No ano passado, as exportações de bens e serviços foram equivalentes a 46,5% do PIB e o início deste ano foi também pouco auspicioso. Segundo a AICEP, a meta de 55% definida pelo Governo até 2029 "constitui um marco ambicioso que reflete a orientação política para o reforço da competitividade externa da economia portuguesa". Mas o CFP levanta dúvidas em relação ao seu cumprimento. Para 2029, antecipa que o peso das exportações no PIB se situe "em torno dos 47%" do PIB.
PERGUNTAS A FRANCISCO CATALÃO, Administrador da AICEP
"Objetivo é ambicioso e atingível"
Francisco Catalão, ex-secretário de Estado e administrador da AICEP, considera que o objetivo do Governo de ter as exportações portuguesas a valerem 55% do PIB em 2029 é "ambicioso" e diz que as empresas estão a mostrar "robustez" face às tarifas.
Ter as exportações a valeram 55% do PIB é exequível até ao final da década?
É a meta que consta do Programa do Governo e estamos a perseguir esse objetivo. É, obviamente, uma meta ambiciosa, para o qual queremos acreditar que temos um plano ambicioso dado o ambiente de tão grande incerteza.
A incerteza criada pelas tarifas torna essa meta ainda mais difícil?
As tarifas alfandegárias dos Estados Unidos são as mais elevadas dos últimos 100 anos e há incerteza a nível da política económica mundial e geoestratégica. Isso coloca alguma incerteza a nível dos processos de decisão das empresas, e acredito que possa dificultar, de certa forma, atingir alguns objetivos. Mas o objetivo é ambicioso e atingível, e tudo faremos para ajudar as empresas portuguesas a cumprir com esse objetivo.
Que impacto estão a ter já as tarifas nas exportações? As empresas portuguesas têm uma grande capacidade de adaptação. Temos alguns dados contraditórios e os próximos trimestres ou semestres são essenciais para avaliar um bocadinho melhor. Com o "delay" na entrada em vigor das tarifas, houve empresas que conseguiram preparar planos de contingência e para diversificar as suas exportações. Neste momento, os dados confirmam alguma robustez e diversificação das exportações portuguesas. Esperemos que se venha a confirmar essa capacidade de adaptação e a reorientação geográfica já está em curso por parte das empresas.
Quais os novos mercados de exportação em que as empresas portuguesas e a AICEP estão a apostar? Estamos a meio de um estudo para definir esses novos mercados estratégicos. Já temos uma "short list" de 20 a 26 mercados onde as empresas portuguesas podem apostar nessa diversificação. Agora, estamos a cruzar isso com outros modelos para criarmos um binómio de mercado-produtos. Ou seja, nesses mercados, quais são os produtos em que as empresas portuguesas podem ter uma vantagem competitiva.
Até ao final da década, o Governo quer ter as exportações a valerem o equivalente a 55% do produto interno bruto (PIB). Mas, para alcançar essa meta e admitindo que a economia não entra em contração, a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) estima que será necessário garantir que o montante total vendido por Portugal ao exterior, em bens e serviços, aumente mais de 3% ao ano.
A conclusão consta do estudo 'A Economia Portuguesa em Contexto de Incerteza Mundial: Análise das Dinâmicas Comerciais", divulgado pela AICEP nesta quinta-feira.
Tendo como referência aos dados de 2024 - em que, em termos nominais, o total das exportações foi de 133 mil milhões de euros e o PIB foi de 285 mil milhões -, a agência pública estima que "as exportações necessitarão de crescer aproximadamente 3,4% ao ano", em termos homólogos, para que a meta do Executivo de Luís Montenegro seja atingida
Esses 3,4% de crescimento homólogo representam, no entanto, o ritmo mínimo que as exportações terão de crescer ao ano, em termos nominais, já que o cálculo é feito para "um cenário de PIB constante", ou seja, em que o crescimento económico é nulo. Isso significa que, se a variação homóloga do PIB for superior a 0%, as exportações vão ter de crescer acima dos 3,4% estimados para atingirem um peso de 55% do PIB em 2029.
Num cenário mais realista - tendo em conta que nenhuma das entidades que acompanham a evolução da economia portuguesa aponta para uma estagnação do PIB até ao final da década -, a AICEP dá conta de que, por exemplo, se o crescimento do PIB nominal médio anual for de 5% até 2029 - mais ou menos em linha com o que se verificou nos últimos cinco anos -, "o crescimento das exportações deverá situar-se em 8,6%".
Com a incerteza provocada pelas tarifas e as tensões geopolíticas na Ucrânia e no Médio Oriente, espera-se que o PIB nominal cresça em torno dos 4%, segundo as projeções económicas do Conselho das Finanças Públicas (CFP) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) - os únicos que têm previsões até 2029. Ora, usando a mesma fórmula da AICEP, a subida homóloga das exportações terá, por isso, de ser de 7,6% para atingir a meta do Governo.
O valor fica acima do que tem sido a média de crescimento nominal das exportações das últimas três décadas (6,5%), o que significa que as exportações vão ter de crescer a um ritmo mais rápido do que o observado até aqui.
Crescer acima da média vai ser, porém, um desafio. Embora as exportações tenham crescido no primeiro semestre - devido, sobretudo, à antecipação das tarifas de Donald Trump -, as projeções económicas apontam para uma desaceleração das vendas de bens e serviços ao exterior nos próximos meses. Além do impacto das tarifas, espera-se que o fraco crescimento da economia europeia e a normalização dos padrões de consumo, incluindo de turismo, após o período pós-pandemia possam penalizar as exportações nacionais.
A entidade liderada por Madalena Oliveira e Silva reconhece que é difícil aferir qual será o comportamento das exportações nacionais, já que as tarifas afetam diretamente os países visados e outros países "integrados nas mesmas cadeias de valor globais". "Consequentemente, as empresas portuguesas podem ser adversamente afetadas por incrementos nos custos dos inputs, desvios nos fluxos comerciais ou perda de competitividade, sem que tais impactos sejam imediatamente percetíveis nas estatísticas oficiais", indica.
Exportações perdem peso desde 2023
As exportações portuguesas atingiram o maior peso face ao PIB em 2022, tendo tocado na altura os 50%. Na altura, esse resultado histórico foi atribuído a ganhos de quota de mercado, mas a inflação deu um forte contributo, já a subida dos preços das mercadorias aumentaram de forma "artificial" o total vendido ao exterior, em termos nominais (que não excluem os efeitos da inflação). Desde então, as vendas de Portugal ao exterior tem perdido todos os anos força em relação à riqueza produzida.
No ano passado, as exportações de bens e serviços foram equivalentes a 46,5% do PIB e o início deste ano foi também pouco auspicioso. Segundo a AICEP, a meta de 55% definida pelo Governo até 2029 "constitui um marco ambicioso que reflete a orientação política para o reforço da competitividade externa da economia portuguesa". Mas o CFP levanta dúvidas em relação ao seu cumprimento. Para 2029, antecipa que o peso das exportações no PIB se situe "em torno dos 47%" do PIB.
PERGUNTAS A FRANCISCO CATALÃO, Administrador da AICEP
"Objetivo é ambicioso e atingível"
Francisco Catalão, ex-secretário de Estado e administrador da AICEP, considera que o objetivo do Governo de ter as exportações portuguesas a valerem 55% do PIB em 2029 é "ambicioso" e diz que as empresas estão a mostrar "robustez" face às tarifas.
Ter as exportações a valeram 55% do PIB é exequível até ao final da década?
É a meta que consta do Programa do Governo e estamos a perseguir esse objetivo. É, obviamente, uma meta ambiciosa, para o qual queremos acreditar que temos um plano ambicioso dado o ambiente de tão grande incerteza.
A incerteza criada pelas tarifas torna essa meta ainda mais difícil?
As tarifas alfandegárias dos Estados Unidos são as mais elevadas dos últimos 100 anos e há incerteza a nível da política económica mundial e geoestratégica. Isso coloca alguma incerteza a nível dos processos de decisão das empresas, e acredito que possa dificultar, de certa forma, atingir alguns objetivos. Mas o objetivo é ambicioso e atingível, e tudo faremos para ajudar as empresas portuguesas a cumprir com esse objetivo.
Que impacto estão a ter já as tarifas nas exportações? As empresas portuguesas têm uma grande capacidade de adaptação. Temos alguns dados contraditórios e os próximos trimestres ou semestres são essenciais para avaliar um bocadinho melhor. Com o "delay" na entrada em vigor das tarifas, houve empresas que conseguiram preparar planos de contingência e para diversificar as suas exportações. Neste momento, os dados confirmam alguma robustez e diversificação das exportações portuguesas. Esperemos que se venha a confirmar essa capacidade de adaptação e a reorientação geográfica já está em curso por parte das empresas.
Quais os novos mercados de exportação em que as empresas portuguesas e a AICEP estão a apostar? Estamos a meio de um estudo para definir esses novos mercados estratégicos. Já temos uma "short list" de 20 a 26 mercados onde as empresas portuguesas podem apostar nessa diversificação. Agora, estamos a cruzar isso com outros modelos para criarmos um binómio de mercado-produtos. Ou seja, nesses mercados, quais são os produtos em que as empresas portuguesas podem ter uma vantagem competitiva.